Cartilha sobre mudanças climáticas e saberes tradicionais no semiárido pernambucano é desenvolvido por Projeto de extensão da UPE – Petrolina

Discutir o clima a partir dos saberes tradicionais também é um ato de resistência. Compreender as dinâmicas locais que atuam na formação territorial de determinado espaço é imprescindível no contexto das mudanças climáticas, tendo em vista, sobretudo, a importância das escalas locais na atuação de medidas adaptativas. Em meio às discussões científicas sobre as mudanças climáticas, e o papel dos agentes políticos em seu enfrentamento, uma questão emerge: e onde estão as vozes das populações suscetíveis aos riscos? Onde estão inseridas as populações mais suscetíveis e vulneráveis aos impactos do clima nas tomadas de decisão?

Em um cenário onde pequenos agricultores rurais, comunidades indígenas e quilombolas são, por muitas das vezes, esquecidos pelo poder público, um Projeto de Extensão desenvolvido pela Universidade Estadual de Pernambuco (UPE), campus Petrolina, se projeta para dar voz a estes atores sociais.

O projeto foi orientado pelo professor de geografia Guilherme Araújo, UPE, alumni (ex-aluno) do CCBA-Recife (Centro Cultural Brasil Alemanha) e ex-bolsista do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD).

Tal projeto tinha como objetivo estudar as mudanças climáticas na pequena agricultura na região do submédio São Francisco e, a partir daí, desenvolver um material didático que desse subsídio para a educação, especialmente, a educação básica. O qual esteve associado às disciplinas de geografia da indústria e geografia da formação socioterritorial do Nordeste. O professor Guilherme Araújo ressalta:

“é importante falar sobre os grupos menos favorecidos, que não são privilegiados no contexto das políticas públicas e da formação histórica territorial do Brasil, especialmente no território do semiárido nordestino”.

Um dos produtos resultantes do Projeto é a cartilha intitulada “Vozes do Clima: Aprendendo com a expedição Opará”.  Cujos autores são os estudantes de graduação em Geografia pela UPE: Denilson Coelho de Sousa, Levir de Menezes Siqueira, Luciano Justino Mendes, Mauricio Lucena Mendes e Rejane Dias da Silva.

Nela, os estudantes atuaram como protagonistas de sua execução. Conforme nos explica o professor Guilherme, “o processo se deu a partir de momentos de pesquisa com discussões, levantamento bibliográfico e campo. A atividade de campo consistiu em três dias. No primeiro, partindo de Petrolina para Petrolândia e lá visitamos agricultores reassentados e produtores indígenas (comunidade Pankararu). No segundo, fomos à comunidade indígena dos Truká em Cabrobó, na ilha de Assunção”.

Imagem retirada da Cartilha Vozes do Clima

Ele reforça que a ideia foi trazer os saberes dos povos tradicionais desta região para compor uma cartilha educativa que seria protagonizada pelos estudantes participantes do projeto na com base no levantamento bibliográfico e no que foi captado durante o trabalho de campo.  A elaboração da cartilha partiu “da proposta de ter personagens os quais retratam uma viagem de campo. Foi desenvolvida então a cartilha a partir da viagem de campo que fizemos tendo os próprios estudantes como protagonistas. Além disso, o projeto de extensão se ampliou também para um documentário”, completa o professor.

Para a divulgação dos produtos desenvolvidos, segundo relatado pelo orientador do projeto, foram realizados dois eventos na UPE-Petrolina, o “Painel: Saberes locais e mudanças climáticas”. No primeiro foi apresentado a versão inicial da cartilha e no segundo, o documentário para a comunidade acadêmica foi apresentado.

Imagem retirada da Cartilha Vozes do Clima

Como o CCBA e a UPE tem um convênio de cooperação e o CCBA desenvolve também projetos e ações para proteção climática, biodiversidade e soberania alimentar na mesma região do Semiárido estamos já conversando com Guilherme sobre ações e projetos em conjunto com ele e a UPE


Esta ação nos remete para as discussões iniciais do texto. Em conversa com o professor Guilherme pudemos discorrer mais sobre tais questões.

“E a pergunta está aí: e os pequenos produtores locais, que vivem aqui, cujas famílias já estão há séculos, como é que eles estão? Como as mudanças climáticas estão afetando a eles? Eles não são beneficiados por políticas públicas fortemente, apesar de existir, não é equitativa”, ressalta o professor Guilherme.

Em ênfase à ideia fundante do trabalho realizado pelo projeto,  ele comenta ainda que “é importante falar sobre os grupos menos favorecidos, que não são privilegiados no contexto das políticas públicas e da formação histórica territorial do Brasil, especialmente no território do semiárido nordestino. E podemos pensar também no território do submédio São Francisco que hoje é um território que vive a ebulição do agronegócio, que foi um projeto do século passado, desde a década de 60, e hoje vivemos uma dinâmica de crescimento econômico, migração constante, principalmente para Petrolina. O mercado imobiliário cresce. A economia é forte. O setor urbano tem se desenvolvido sobre forte potencial de crescimento econômico no terceiro setor”.

Quanto ao papel da Universidade pública no cenário de medidas de enfrentamento às mudanças climáticas, o professor Guilherme enaltece o seguinte: “Eu acredito que a academia não tem forças para enfrentar as mudanças climáticas, mas ela tem força para orientar a população sobre o que está ocorrendo. E nisso em nosso caso aqui, ou seja, formação de professores, orientar futuros docentes sobre a questão climática atual, impactos na sociedade e como a política tem um papel fundamental nisso. Como as políticas públicas, por exemplo, devem ser implementadas para beneficiar grupos que são historicamente prejudicados. A academia tem esse papel de proporcionar essa reflexão, debate e disseminar esse conhecimento para a população”.


Assista ao documentário completo “Expedição Opará: clima e agricultura no semiárido”


Acesse ao conteúdo da Cartilha: