Nas últimas décadas, o uso da “tecnologia” e os transgênicos tornaram as safras de produtos agrícolas muito maiores, e por causa das modificações genéticas e a presença de tanto veneno que é pulverizado sobre os alimentos provenientes deste tipo de agricultura se tornaram extremamente danosos à saúde humana e ao meio ambiente. Quase sem ter acesso a produtos de pequenas propriedades, sem venenos e agrotóxicos, as pessoas foram deixando de consumir e de ter uma alimentação mais saudável. Na contramão dessa cultura comercial de consumo, produtores orgânicos foram ganhando força e se organizando e nesse processo surgiu a agricultura orgânica e o selo de produtos orgânicos.
O que significa a certificação orgânica? É o procedimento pelo qual uma certificadora devidamente credenciada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) assegura por documento que determinado produto, processo ou serviço obedece às normas e práticas de produção orgânica.
Para que um agricultor ou agricultora seja reconhecido como produtor orgânico, vai precisar de um Organismo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OAC), que tem que ser credenciado junto ao MAPA, ou então o produtor organizado em associação e/ou cooperativa se cadastra no MAPA para realizar a venda direta ao consumidor sem a certificação. Neste caso, a garantia de qualidade orgânica se dá pela Organização de Controle Social (OCS).
Identificamos três tipos de mecanismos de garantia de qualidade orgânica para produtos orgânicos disponíveis para o consumidor: Certificação por Auditoria via OAC, Certificação participativa via OAC e Registro no MAPA via OCS. São caminhos diferentes para se conseguir a garantia de qualidade orgânica, em cada um deles varia a maneira de obter o registro junto ao MAPA e onde os produtos podem ser comercializados.
A lei que regula os produtos orgânicos foi criada em 2003, Lei nº 10.831/03, mas é importante saber que para cada tipo de atividade produtiva tem uma Instrução Normativa do MAPA. A passagem de um produtor que está no sistema convencional (uso de adubos químicos) para o sistema de produção orgânica é chamada de “Período de Conversão”, dependendo da cultura desejada pode levar até 18 meses. O produtor passa a valorizar e a por em prática uma agricultura camponesa fundamentada em saberes tradicionais.
Certificação por Auditoria (OAC)
Quem usa mais esse tipo de certificação são as cooperativas de produtores com rendimentos mais altos e/ou agricultores individuais, não organizados em associação de produtores. Seus produtos orgânicos podem ser comercializados em qualquer lugar: feiras, quitandas, supermercados, entre outros. Neste caso a concessão do selo SisOrg é feita por uma certificadora credenciada pelo MAPA. A Certificação por Auditoria obedece a procedimentos e critérios reconhecidos internacionalmente, além dos requisitos técnicos estabelecidos pela legislação brasileira. A legislação europeia é mais rigorosa e restritiva do que a brasileira.
Para estar legal, um Sistema Participativo de Garantia de Qualidade Orgânica (SPG) tem que possuir um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (OPAC) legalmente constituído, que responderá pela emissão do selo SisOrg. O OPAC é quem assume a responsabilidade formal pelo conjunto de atividades desenvolvidas em um SPG, constituindo na sua estrutura organizacional uma Comissão de Avaliação e um Conselho de Recursos, ambos compostos por representantes dos membros de cada SPG. O SPG funciona como um sistema de controle interno e visa garantir que todos adotem e respeitem os procedimentos regulamentados.
Certificação Participativa (OPAC)
Igual como o selo emitido via auditoria, a certificação participativa também permite a venda a estabelecimentos comerciais, feiras etc (a venda não direta ao consumidor). A diferença é que um Organismo Participativo de Garantia pode ser composto por um grupo de técnicos, produtores e até consumidores em uma espécie de cooperativa, o que permite a diminuição do valor pago pelo produtor para ser certificado, quando comparado à certificação por empresa de auditoria.
Para estar legal, um Sistema Participativo de Garantia de Qualidade Orgânica (SPG) tem que possuir um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (OPAC) legalmente constituído, que responderá pela emissão do selo SisOrg. O OPAC é quem assume a responsabilidade formal pelo conjunto de atividades desenvolvidas em um SPG, constituindo na sua estrutura organizacional uma Comissão de Avaliação e um Conselho de Recursos, ambos compostos por representantes dos membros de cada SPG. O SPG funciona como um sistema de controle interno e visa garantir que todos adotem e respeitem os procedimentos regulamentados.
Controle Social na Venda Direta
É um reconhecimento da legitimidade da relação de confiança criada entre o produtor orgânico e o consumidor na venda direta em feiras livres. Esse tipo de registro como produtor orgânico no MAPA via a OCS permite a venda direta ao consumidor sem a exigência do selo SisOrg
Podem ser contemplados por esse processo de certificação grupos de agricultores familiares, projetos de assentamento, quilombolas, ribeirinhos, indígenas e extrativistas. Exige-se, porém, o credenciamento em uma Organização de Controle Social cadastrada em órgão fiscalizador oficial (MAPA). É um tipo de geração de credibilidade organizado a partir da interação de pessoas ou organizações, sustentado na participação, comprometimento, transparência e credibilidade das pessoas envolvidas no processo de geração de confiança. Com isso, os agricultores familiares passaram a fazer parte do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos.
Maior segurança ao consumidor
Para que um produto possa ser considerado orgânico, sua produção precisa seguir algumas normas básicas de respeito à terra e aos ecossistemas: respeito à toda a natureza, seus bens renováveis e não-renováveis; diversificação de culturas para evitar que o solo seja esgotado em nutrientes; manejo de solo como um organismo vivo, usando adubos não nocivos e naturais; substituição de insumos agrícolas por bens naturais e não-nocivos, além de atender a Lei N. 10.831/03 e a Instrução Normativa relacionada à cultura produzida. Ao solicitar a certificação orgânica de órgãos autorizados as propriedades, entidades produtoras, cooperativas e associações comunitárias de agricultores familiares devem respeitar todas as condições exigidas, além da documentação necessária para que se possa conferir a certificação e oferecer os dados precisos ao consumidor na hora de oferecer o produto orgânico nos locais de vendas.
A EXPERIÊNCIA DA ECOARARIPE
O Boletim AGREGA entrevistou Lídio Parente, presidente da Ecoararipe – Associação dos Agricultores Agroecológicos dos Sertões do Araripe, fotografo, com formação em Química Industrial. O Projeto AGREGA apoia algumas experiências da agricultura familiar naquela região do semiárido pernambucano.
O que é e para que serve a certificação orgânica participativa?
A certificação leva em conta procedimentos que devem ser adotados em relação a colheita e armazenamento, o controle da água utilizada, o controle das embalagens, a limpeza de um modo geral e o uso absoluto nenhum de agrotóxicos.
Que benefícios ela traz para a agricultura familiar?
De certa forma, ajuda agricultores agroecológicos a ficarem atentos às suas obrigações na produção orgânica, eles são fiscalizados quanto aos cuidados com a terra, com o ar, não se podem queimar nada na propriedade, e quanto ao uso de defensivos agrícolas somente os certificados pelo MAPA. Existe uma lista de produtos que podem ser usados na agricultura orgânica. As culturas devem ser de sementes que também passam pela certificação orgânica, é necessário saber a origem dessas sementes.
Como se forma uma certificadora participativa, que na legislação é denominada OPAC e como acessar a certificação participativa?
A sigla OPAC significa Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade. Essa avaliação de conformidade é que vai dar garantia à qualidade orgânica dos produtos. Na ECOARARIPE só temos certificação orgânica para produtos primários, o que se planta e o que se colhe. Quaisquer pequenas transformações já vão para outro plano. Essa avaliação de conformidade participativa é feita pelos próprios agricultores, as exigências são bastante amplas dentro da Agroecologia, desde o cuidado com o solo, utilização de pequenas ferramentas para não compactação de solo, curva de nível para não haver desgaste do solo, manejo com o lixo.
Como os agricultores familiares conseguem o selo para os produtos orgânicos?
Cada grupo de agricultores que atua de forma atenta visando garantir que a produção seja de fato orgânica. Primeiro, eles passam pela formação para ter o status de agricultor agroecológico até chegarmos ao selo orgânico que dá essa garantia ao produto, para que ele possa ser vendido em qualquer parte do país. Cada grupo de agricultores visita outros grupos, em uma espécie de intercâmbio, sendo que um grupo de agricultores de uma mesma associação não pode se visitar mutuamente. Eles têm que ter uma documentação, que é o plano de manejo escrito por cada um desses agricultores, o caderno de campo e o manual desses procedimentos, que são procedimentos de verificação e avaliação de conformidade. Se essa verificação estiver correta durante as visitas, segue para uma comissão onde é atestada a conformidade dessas exigências. É um processo bastante seguro, pela responsabilidade e todo o trabalho que cada um dos agricultores tem entre si. Na avaliação de toda a produção cada um deles é responsável, ou seja, se houver qualquer problema em uma produção orgânica todos são penalizados, sabendo das normativas e tudo isso é fiscalizado pelo MAPA.
No site do MAPA você pode consultar todas as instruções normativas e a Instrução Normativa nº 19, de 28/05/2009, que trata sobre os mecanismos de controle de qualidade da produção orgânica, que são as certificadoras por auditoria (Organismos de Avaliação da Conformidade Orgânica – OAC), a certificadora participativa (OPAC) e os Organismos de Controle Social (OCS), que são as associações de produtores orgânicos que vendem nas feirinhas e não tem o selo, permitindo apenas a venda direta ao consumidor. Fonte: http://www.agricultura.gov.br/desenvolvimento-sustentavel/organicos/regularizacao-producao-organica
Para saber a lista de todos os produtores orgânicos do Brasil a informação está disponível no site do MAPA e é atualizada frequentemente. Fonte: http://www.agricultura.gov.br/desenvolvimento-sustentavel/organicos/cadastro-nacional-produtores-organicos
Antes da pandemia do Coronavírus, foram divulgados números crescentes da produção orgânica no Brasil e no mundo. O mercado anual vinha superando a casa dos 3 bilhões de reais e 80 bilhões de dólares, respectivamente. O Brasil possui cerca de 5,2 milhões de propriedades rurais. O Censo Agropecuário de 2006 apontou 90 mil propriedades que utilizam técnicas orgânicas, porém somente 16.000 produtores orgânicos são cadastrados no MAPA, sendo 6.257 por certificação; 5.084 por sistema participativo e 4.692 por venda direta com controle social, mas somente os dois primeiros podem utilizar o selo de orgânicos. O selo único de orgânicos aumentou sensivelmente o consumo e o número de produtores. O acesso a mercados é um dos desafios de crescimento no número de produtores, sendo que a avaliação da conformidade é essencial, mas, às vezes, ela se mostra pouco acessível aos pequenos negócios.
A engenheira agrônoma e especialista em Agroecologia, membro cofundadora e produtora da Rede de Hortas do Bem Comum, Simone Miranda analisou a importância da certificação orgânica para a agricultura familiar. Ela que atua como palestrante, facilitadora de oficinas e nas principais ações da RHBC, realizou também diversas atividades de campo em comunidades de Pernambuco apoiadas pelo Projeto AGREGA.
Qual a importância da certificação orgânica, que benefícios ela traz?
Simone: A obtenção do selo orgânico traz a garantia para o consumidor sobre a qualidade do produto e permite ao produtor ampliar as possibilidades de escoamento e comercialização de seus produtos, tanto em questão de locais possíveis quanto ao raio de alcance. Contudo é preciso ressaltar também a importância social da venda direta ao consumidor em feiras livres, com base na relação de confiança criada entre produtor-consumidor e estabelecidos em critérios de transparência. Outro aspecto positivo das feirinhas orgânicas e/ou agroecológicas é o ambiental, uma vez que estas abrangem circuitos curtos de comercialização, diminuindo a pegada ecológica adquirida pelo produto durante o caminho percorrido até chegar a mesa do consumidor. Quanto mais distante for o produto, mais impacto ambiental será gerado.
Que experiências de certificação orgânica você teve a oportunidade de conhecer e acompanhar?
Simone: Desde a universidade acompanhei processos de certificação orgânica junto a uma associação do Rio de Janeiro, a Abio (Associação de Agricultores Biológicos do Rio de Janeiro), que hoje é uma certificadora participativa. Mais recentemente acompanhei uma certificação por auditoria para uma empresa que comercializa produtos orgânicos. Apesar dos dois sistemas, participativo e via auditoria, possibilitarem a obtenção do selo pelo produtor, são processos bem distintos, sendo o participativo mais inclusivo e justo.
O que pode ser feito para contribuir em boa escala, com o crescimento do número de produtores certificados?
Simone: Acredito que precisamos aumentar a assistência técnica no campo no sentido de gerar discussões sobre as normas técnicas de produção orgânica, fortalecer as práticas agroecológicas e mobilizar as associações, técnicos e consumidores para criar e formalizar mais certificadoras participativas no estado.