Participantes do curso em Sistemas Agroflorestais. |Foto: Catarina de Angola
por Catarina de Angola
O território do povo indígena Xukuru do Ororubá, em Pesqueira, Agreste de Pernambuco, sediou, entre os dias 13 e 15 e abril, um curso de implantação de Sistemas Agroflorestais (SAFs). A atividade foi realizada na Aldeia Couro Dantas, no Cacho Baixo, e contou com a participação de cerca de 20 pessoas entre indígenas, comunidades vizinhas e estudantes que implementaram um SAF, em sistema de mutirão. A formação foi um intercâmbio com os agricultores agroecológicos Vilmar e Silvanete Lermen, que tem experiência com SAFs na Chapada do Araripe, no município de Exu. O curso integra as atividades do Projeto Agrega – Agroecologia com Energias Alternativas executado pelo CCBA – Centro Cultural Brasil – Alemanha.
Segundo Iran Neves, integrante do Coletivo de Agricultura Xukuru Kreká, o intercâmbio de conhecimento na área de SAFs já era uma necessidade, e com a participação no Projeto Agrega pode ser concretizada. “Essa ideia de ter uma experiência com SAF e agroecologia é antiga. Vimos que poderíamos usar esse espaço a favor do projeto de vida do povo, com práticas de cultivo que pudessem, além de combater o sistema do agronegócio, também fortalecer as práticas tradicionais, que tem uma série de elementos ligados à nossa identidade. Com o Agrega, percebemos a possibilidade de executar esse sonho, de trazer pessoas com experiência de intercâmbio como Vilmar e Silvanete, e estamos aqui realizando isso, uma etapa de algo que foi pensando lá trás. Mas com o desafio de ampliar, não só o espaço coletivo e de gestão no uso do território, mas de respeito a mãe terra, de preservação ambiental e produção de alimentos”, explicou Iran.
Durante os três dias, os facilitadores Vilmar e Silvanete Lermen executaram uma metodologia de estudo e reflexão, com debate, apresentação de informações e vídeo, aliada ao trabalho na prática em uma área de 400 m2. Todo processo aliado a troca de saberes, a partir da construção do conhecimento de cada participante. “A gente vem da Serra dos Paus Dóias, em Exu, onde temos uma experiência de agrofloresta na família, mas também na comunidade com outras famílias e na Agrodóia, que é a associação que participamos. E com o curso aqui, estamos adequando tudo de acordo com a realidade do Povo Xukuru, como as espécies. Aqui é um brejo de altitude, apesar de ser caatinga. E eu imagino que esse seja apenas um início de formação, porque é difícil em um só encontro dar conta toda a complexidade da agrofloresta. Então vamos manter o contato e quem sabe no futuro fazer um intercâmbio para conhecer a área nossa ou para uma área do projeto, mais próxima aqui da realidade”, explica Vilmar.
Luzimar Gonçalves é filha nativa dos Xukurus, mas há 30 anos estava morando foram. Voltou a pouco tempo para sua terra e está trabalhando na produção de mudas medicinais e ornamentais. Para ela, o curso foi um momento de muito aprendizado e novidades. “Como eu passei muito tempo fora, quero aprender as coisas novas, voltar a ter contato com a natureza e muita coisa mudou nesse tempo. O mundo que a gente vive na capital é um mundo de cimento, isso aqui é outra realidade”, diz.
“Fazer essa troca de experiência é um aprendizado muito rico e sempre desafiante. Porque é uma nova realidade e não podemos achar que vamos trazer o conhecimento, ele é construído com os outros agricultores aqui. E era uma expectativa grande nossa também de vir para cá, porque sabemos que os Xukurus são um povo de luta, um povo guerreiro”, partilha Silvanete, sobre seu sentimento em contribuir com a facilitação.
AGREGA –A Aldeia Couro Dantas, no território Xukuru, integra as ações do Projeto Agrega, realizado pelo CCBA, e que desde começo deste ano 2018 tem contribuído para a implementação de pequenos projetos decentralizados introduzidos e geridos pelos próprios agricultores e agricultoras. Além de Pesqueira, participam também iniciativas de Exu, Afogados da Ingazeira e Brejo da Madre de Deus, todos em Pernambuco. Essa iniciativa também vai propiciar outras ações ao povo Xukuru, como a construção de uma cisterna de placas 72 mil litros de capacidade de armazenamento de água da chuva, coletava através do telhado da Casa de Sementes, que funciona como um centro comunitário, chamada de casa mãe.
“A gente acredita que a cisterna vai ser suficiente para atender nossas atividades de uso doméstico aqui da casa mãe. Ela nos dá uma certa autonomia, com relação ao uso da água. O projeto Agrega também vai nos financiar um meliponário e vamos construí-lo na perspectiva de um santuário, onde teremos abelhas nativas, que estão ameaçadas, para garantir a espécie e para que as pessoas possam serem guardiões das abelhas. E que o mel pode ser utilizado nas nossas práticas e rituais e todo mundo que tenha acesso ao terreiro vai acessar isso”, explica Iran.